Vamos conversar sobre sexo
Antes de começar a falar sobre sexo, queria deixar registrado que tenho vários problemas com sexo.
Sofri abuso dos 3 aos 5, nunca consegui ter um orgasmo transando com outra pessoa, só quando estou sozinha e mesmo assim nunca foi esplendoroso. Ainda tenho uma grande desconexão com o meu corpo e, pelo que consegui investigar, tem relação com o abuso. Também como presente do abuso, sou masoquista sexual. Na minha vida de solteira passei por algumas situações de abuso, como é comum acontecer com as pessoas que passam por abuso na infância, e tive vários anos de vida sexual ruim no meu casamento.
Com essas credenciais, seria justo se perguntar como eu posso aconselhar alguém sobre temas sexuais. Eu me sinto à vontade porque, por serem questões pessoais, que doem em mim, já refleti bastante e investiguei bastante. Mas o que considero o principal parâmetro: veja se faz sentido pra você. Não tenho o objetivo de convencer ninguém, se for a sua verdade, você vai ler e sua alma vai reconhecer na hora.
Descrevi os podres, então acho justo falar de credenciais. Apesar de ter passado a adolescência toda sem nunca ter nem beijado um garoto (já que me via como alguém feia e ridícula) quando fui pra faculdade comecei minha vida amorosa e sexual tudo junto. Descobri que sexo era algo muito fácil pra mim. Cresci sob o moralismo do Espiritismo, sob a vibe de mundo de expiação e provas, sexo só com amor porque quando é sem amor há vampiros espirituais sugando sua energia, todo mundo precisa ter missão, objetivo e trabalhar e se possível se sacrificar em prol da humanidade.
Mas fui pra USP e tive a oportunidade de fazer matérias optativas na gloriosa Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Credito principalmente aos meus bons amigos e às matérias de Antropologia. Quando você começa a vislumbrar a vastidão do mundo, das culturas, pra mim foi impossível ficar na postura de "isto aqui é a verdade universal e quando vocês evoluírem acreditarão no que eu acredito". Eu e meus amigos gostávamos especialmente de um professor de cultura africana, esqueci o nome, mas era um homem negro lindo, culto, suave, a gente gostava dele e ele gostava da gente a ponto de algumas vezes termos ido pra sala dele depois das aulas para papear.
Pode parecer estranho, mas minha visão de mundo pós a FFLCH também é credencial sexual, porque diminuiu muito meu moralismo. E, sendo moralista, a pessoa que se dispor a falar de sexo só saberá dar conselhos moralistas.
Frequentei a FFLCH, comecei minha vida sexual, transei fácil com vários homens.
Sou neta de japoneses, tenho o lado robótico, focado, inteligente e eficiente. Sem o peso do moralismo pude aplicar meus dons na dimensão sexual, e descobri que ao conversar com um homem (1) insinuar que sexo é algo fácil faz um tapete vermelho se abrir na sua frente, (2) saber fazer sexo oral é como um super-poder. Meu prazer nunca importou, mas ter aprendido sobre sexo oral me tornava plenamente confiante. Minha sensação era que, se o homem não precisasse de mulher com aparência de modelo, eu poderia sair com quem eu quisesse, mesmo que fosse uma noite e nada mais. Essa é uma sensação que empodera muito, e ajudou a combater bastante do estrago dos anos de bullying. Não vou dizer que o que eu fiz na minha vida foi o melhor caminho... apenas que foi o meu caminho
Apesar dos meus problemas, tenho um currículo peculiar: sei o que é me sentir feia e ridícula e tímida, sei explicar como me tornei confiante e ousada e aconselhar pessoas nesse caminho da autoconfiança, sei o que é viver tarada pelo marido, de fazer sexo 11, 14 vezes na semana, sei o que é a vida sexual murchar e até começar a acreditar que sexo não era mais pra mim. Tenho algumas experiências exibicionistas, inclusive algumas recentes. Antes de me separar vivi alguns meses de casamento aberto, passei pelo Tinder, descobri que mesmo depois de 16 anos de casamento e definhamento sexual, sexo ainda era algo muito fácil, que eu podia fazer boquete a luz do dia dentro de um carro sem insulfilme na Praça do Por do Sol, que eu podia chupar o dedo de um cara no meio do Astor lotado, que eu podia encontrar um cara, conversar 20 minutos e ir pra um motel (e depois ficar chorando na pia do banheiro).
E tenho meus conhecimentos sobre abuso, masoquismo, origens e mecanismos do desejo de submissão e do fascínio por dor. Quando descobri meu masoquismo sexual aquilo me deixou tão desconsertada que fui investigar tudo que consegui achar, conversei com vários terapeutas, sexólogos, li muita coisa, em especial fragmentos de informação em depoimentos de outras pessoas. Hoje o que eu sei sobre esses temas me satisfaz.
Posso ter problemas não resolvidos ainda. Mas tenho muitas reflexões para compartilhar.
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