Vantagens de ser deusa em vez de humana

Querida Sis,

Como sempre falo, não acredito em verdades universais sobre a estrutura de pensamento e crenças filosóficas. Para mim, karma existe para quem acredita em karma, mas não existe para quem não acredita. Para mim o karma vem da culpa: você sente que fez algo errado, aquilo te corrói, mesmo que seja no seu subconsciente, e acaba acontecendo algo para você purgar aquilo. Acredito de verdade que você pode adquirir um karma pesado porque num momento de raiva empurrou seu irmão, ele caiu e machucou o braço. E você pode ser um soldado que matou dezenas de pessoas, mas acreditava de todo coração que fazia isso por um bem maior, sem raiva nem prazer nem culpa. E não ter karma nenhum.

Você não deve estar vendo, mas tenho escrito sobre magia, estrutura mental, os significados que nós criamos pra nossa própria mente.

É comum eu falar da metáfora da Elliott, de que somos todos Sherazade e podemos viver mais um dia se contarmos uma história bonita sobre nossa vida, sobre quem somos. Falo disso para as pessoas e vejo que elas concordam, acenam com a cabeça. Mas ao mesmo tempo, essas pessoas me contam histórias tristes sobre sua vida, sobre quem são e o que acontece com elas.

Na nossa conversa chegamos num ponto em que vimos que eu tenho uma crença, você tem outra. E, como deixei bem claro, para mim é meramente isso: é a minha crença. Não é a verdade universal, nem a versão "evoluída", naquelas de que quando você evoluir será capaz de enxergar o que eu enxergo. É apenas a versão que escolhi por enquanto, e sei que muitas vezes fiz outras escolhas. Inclusive, não acredito que seja uma progressão linear do sofrimento para a felicidade. A Silvana falou e pra mim faz sentido que, sendo uma alma muito velha, teve uma fase em que pensei que já sabia tudo da felicidade e quis experimentar a dor e o sofrimento. Por isso, tenho tentado pensar e falar das coisas sem colocar um peso de que felicidade e facilidade é bom, tristeza e sofrimento é ruim. E sim que são apenas escolhas.

Com este longo disclaimer, queria dizer que o que vou comentar sobre suas questões com as quais você tem se debatido, não julgo como atraso de vida. Nem que a minha sugestão seja a verdade universal ou a melhor solução. É apenas a solução que encontrei pra mim, que fez sentido pra mim, que traz felicidade, potência, força, até mesmo alegria pra minha vida.

Tive um namorado que me falava, em tom de acusação, que eu enxergava as pessoas melhores do que elas são. A acusação era porque ele se sentia "puxado". Cansado de ter que estar sempre tendo que se confrontar com os fantasmas e demônios dele, nossas conversas, quando ele era infantil ou babaca comigo, e eu explicava para ele por que ele tinha feito aquilo, e aquela reflexão impelia a uma mudança. Que uma boa parte dele não queria, imagine que era um mestrando da exatas da Unicamp mas que contava com muito orgulho sobre um programa infantil pra crianças de 5 anos que ele gostava de assistir, e não parecia conexão com a criança interior, mas como se fosse a proclamação de que ele não queria ser adulto.

As pessoas são feitas de muitas coisas e têm diversas dimensões.

Hoje eu sei que para mim é essencial me conectar com a esfera do espetacular que existe em mim e nos outros.

Somos humanos, falhos, com qualidades e defeitos etc, como você falou. Mas eu também acredito que todos temos a centelha divina, que TODOS somos deuses em potencial. E que dependendo da minha energia e do que eu penso e falo, acesso e me conecto com uma determinada parte da pessoa. E no geral, tento expor minha parte divina e me conectar com a parte divina dela.

Eu me formei em Editoração, trabalhei em empresas, fui gerente de uma pequena equipe, sou birdwatcher, já fui ativa como cidadã, sou neta de japoneses e bem respeitosa em eventos sociais. Também sou masoquista sexual, feminista, panfletária do movimento sex-positive, bruxa. Medito, faço rituais. Fotografo natureza, já viajei para vários países, tenho alguns terabytes de fotos. Também tenho um lado artístico que adora artes plásticas, que sabe desenhar um pouco e gostaria de voltar a desenhar, que adora museus e artesanato.

Na época que eu era birdwatcher, durante uns anos sempre que eu podia estava no mato fotografando natureza. Criei um site de divulgação da natureza. Atuei com autoridades pelo reconhecimento da atividade, pra gente parar de ser proibido de fotografar com base no tamanho da câmera, tem uma portaria estadual publicada em boa parte graças ao meu trabalho.

Mas nessa época meu lado bruxa nem existia, o sex-positive também não, e o lado artista até hoje está na gaveta. Agora minha energia está concentrada em ser bruxa, e a birdwatcher e cidadã estão na gaveta.

Eu posso não ser birdwatcher, mas não posso deixar de ser neta de japoneses. Poderia decidir que meu foco seria lidar com minha herança cultural, minhas questões com o bullying, e focar nisso. Em vez disso, decidi focar minha energia no lado bruxa. Continuo sendo neta de japoneses, com questões não totalmente apaziguadas com minha ancestralidade, mas tenho vivido na sintonia da magia. Por escolha. 

Tenho feito escolhas de concentrar minha energia na centelha divina que existe em mim, e nos outros. Em conversar comigo, e com os outros, puxando para o lado da magia, do espetacular, do incrível.

Continuo sendo humana, falha, mortal, sujeita a erros, problemas, desgraças, doenças etc.

Mas escolhi sintonizar em outro canal.

Como te falei, nem tenho mais defeitos. Entendo como é chocante e que você deve ter achado absurdo quando você falou "todos temos qualidades e defeitos", e eu te falei "eu não tenho defeitos".

E depois expliquei que posso ter características que os outros consideram negativas, "defeitos", mas  que pra mim não são.

Eu escolhi me ver como alguém linda, gostosa, inteligente, genial, poderosa, bruxa, forte, instigante, criativa, mágica, sexual, ousada, destemida. Tenho características que tenho trabalhado em mim: ser capaz de pedir, ser capaz de me vulnerabilizar, de baixar armaduras. De ser a cada dia mais leve e mais alegre.

Mas não me vejo como alguém com defeitos.

Pra ficar claro: qualquer pessoa pode me olhar de fora e apontar dezenas. Você é robótica, é fria, é desumana, é uma desavergonhada que defende a promiscuidade, não está dando todo o suporte que deveria dar para seus pais, você não está ganhando dinheiro nem preocupada em acumular dinheiro para poder cuidar deles, você é sedentária, tem sobrepeso e não acha isso um problema, você não tem casa nem carro, você é um monstro que machucou o coração de um homem bom, que teve coragem de abandonar seu enteado que você diz amar tanto, você é arrogante e acha que sabe de tudo, se declara xamã sem nunca ter estudado, acha que pode aconselhar pessoas sem ter feito cursos para isso, você é desconfiada, você quando se fecha é muito irritante, é uma chatice conversar com você, você é louca e acredita em um monte de fantasias etc etc

Mas pra mim eu não tenho defeitos.

Pra mim eu sou maravilhosa.

E porque sou maravilhosa, tenho todo o direito de viver uma vida maravilhosa, espetacular, mágica. Criei uma estrutura de vida em que não tenho obrigações com pais, não tive filhos, meu enteado é quase adulto e me sinto totalmente em paz com ele e vice-versa, a gente papeia pelo WhatsApp, temos apelidos carinhosos um para o outro. Fiz uma separação amigável e sei que sempre terei o amor e o apoio do meu ex-marido, assim como ele sempre terá meu amor e apoio. Tenho um dinheiro guardado. Enquanto eu não voltar a ganhar dinheiro é uma vida frugal, mas me dá a tranquilidade de não precisar procurar imediatamente um emprego. É o tipo de coisa que, quando passar a pandemia, seria possível eu passar uns meses no Acre aprendendo com os índios. Ou passar meses vivendo em lugares diferentes do Brasil.

Porque sou maravilhosa e não tenho defeitos, posso ser bruxa, aconselhar pessoas. E, em breve, ganhar dinheiro com isso. Mesmo sem ter feito faculdade de Psicologia, estágio supervisionado.

Se eu não fosse maravilhosa, e sim alguém com qualidades e defeitos como qualquer um, alguém dual etc, acho que não poderia estar fazendo isso. E sim tendo que procurar uma recolocação profissional em uma empresa em São Paulo para trabalhar pelo menos 50h por semana. 

Se eu não fosse maravilhosa e sem defeitos, não poderia ter contado pros meus pais todos os meus "podres", porque ia me sentir um monstro que só pensa em mim, que não teve a menor consideração pelos sentimentos dos meus progenitores. Não poderia blogar e conversar com as pessoas sobre sexo, magia, terapia das selfies, viveria com medo disso chegar nos meus pais e provavelmente aconteceria porque em geral nossos medos acontecem. Mas contei uns meses atrás. Meu worst case scenario era algum possível desafeto fazer questão de me investigar, chegar nos meus pais e falar "sabia que sua filha é uma vagabunda?". E agora a resposta seria "sabemos, ela nos contou meses atrás, você está atrasado". 

Não seria capaz de fazer rituais, curar pessoa, ter visões, ajudar pessoas a pararem de ter pesadelos ou a sonhar mais. Só poderia tentar depois de fazer muitos cursos com pessoas altamente qualificadas, famosas e com respaldo da opinião pública. Porque me veria como alguém pequena e incapaz.

Porque eu sou maravilhosa, me apaixonei por um homem maravilhoso. Ele é incrível, de cair o queixo. Escreve textos que uma amiga disse "Caralho! Eu daria pra esse cara só por causa desse texto!". Ele é lindo, sexy, profundo, magnético. Nas palavras da Loba raposa vermelha, para quem mostrei uns pedacinhos do que tenho "sombrio e fundo de alcançar. Enigmaticamente abissal. Lindo e contido e quase gélido, um tesão de homem amedrontador, pois você nunca sabe onde pisa".

Minha Chama tem sangue de dragão correndo nas veias. Ele escreve melhor do que eu, é a pessoa capaz de me dar insights, me impressionar, me tirar do tilt. Eu me considero uma pessoa madura e com alta inteligência emocional, mas ele me supera. É alguém que eu não controlo, não domino, não coloco no bolso. Tem mil portões entre mim e as pessoas: mas ele, de repente olhei e ele estava do meu lado, é como se ele tivesse flutuado, voado e passado por todos, e confio totalmente nele.

O lado humano dele tem vários traumas, problemas, defeitos. Assim como o meu lado humano idem. Mas eu vejo o espetacular que existe dentro dele, assim como ele viu o meu.

Você tem todo o direito de se perguntar se é pura fantasia minha, afinal ainda não tenho o concreto. Mas acredito de verdade que é possível. Faz sentindo no meu íntimo, tem os relatos dos meus professores do O Corpo Explica, da Carolyn Elliott e de pessoas que fizeram cursos com ela. Acredito de verdade que é possível se curar e entrar na sintonia capaz de viver o espetacular.

Tudo que você falou é verdade: as pessoas têm qualidades, defeitos, fraquezas, dualidades, sem dúvida alguma. Mas não é com essa dimensão que eu quero lidar. Quero viver na dimensão do mágico, do incrível, do espetacular, da marmelada.

E tenho conseguido.

Tenho conhecido pessoas espetaculares e vivido eventos espetaculares. E tudo fica mais espetacular ainda porque a história que conto pra mim e pros outros é uma história bonita e mágica. Tudo que vivi, eu poderia contar a mesma história descrevendo-a de forma negativa, triste, pessimista. E seria uma outra vida, eu seria outra pessoa.

Você falou que não sabe como lidar com seu censor interno. Tenho certeza de que existem várias técnicas e caminhos, mas posso compartilhar o que fiz com o meu: enquanto eu alimento minha centelha divina, a crença de que sou divina, incrível, linda, gostosa e maravilhosa

não tem mais censores, demônios gritando minhas fraquezas, defeitos, falhas.

O que sinto é muito amor. Muita confiança. Muita tranquilidade.

Zero ansiedade. Às vezes um pouco de tristeza e o risco de cair no abismo da auto-piedade, mas em geral a meditação me coloca no meu centro de novo.

Em resumo: eu sintonizei com minha centelha divina, e meus demônios, censores, viraram filhotes fofinhos.

Meu caminho é apenas a escolha que fiz.

Mas queria dizer que pra mim faz sentido que você tenha esse censor interno se sua estrutura mental é "todos têm qualidades e defeitos, todos somos falhos. Fulano tem defeitos e qualidades, assim como eu", em vez de "sou linda, gostosa, maravilhosa, sintonizada com minha centelha divina. Tudo vem pra mim com leveza, facilidade, alegria e glória. Magia existe, o espetacular existe. Sou uma pessoa incrível e mereço viver uma história maravilhosa com alguém tão incrível quanto eu". 

Falei algumas vezes mas reforço que não é uma crítica, nem uma declaração de que você precisa mudar de ponto de vista. É só a minha hipótese de possíveis desdobramentos de escolher a visão focada no humano em vez de no divino que existe em cada um de nós.

Beijos com muito amor.


 

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